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Se você foi atraído pelo título e se interessou em ler este artigo, muito provavelmente sabe, e vive na pele, o fato de que as startups precisam enfrentar dez vezes mais obstáculos do que as "empresas comuns" para obterem sucesso. Isso porque, segundo Eric Ries, autor do renomado livro A Startup Enxuta:
"Uma startup é uma instituição humana projetada para criar novos produtos e serviços sob condições de extrema incerteza."
Essas condições de extrema incerteza irão existir independentemente do ramo de atuação, do porte da empresa, do tipo societário escolhido e do enquadramento tributário, até porque uma startup irá lidar, em maior ou menor grau, com a escassez de dois fatores de produção: i) recursos financeiros (capital); ii) recursos humanos (mão de obra). E é justamente para minimizar os efeitos da escassez deste último fator que surge o Contrato de Vesting.
1. O que é Contrato de Vesting?
Derivado dos Stock option plans (planos de outorga de ações), o Vesting é um instrumento contratual que prevê uma aquisição progressiva de direitos sobre o negócio. Por isso, essa espécie contratual é largamente utilizada pelas startups como meio de atração e retenção de talentos.
O objetivo do vesting, portanto, é, de um lado, sanar a deficiência da startup quanto à falta ou insuficiência de uma mão de obra (extremamente) especializada, e, de outro lado, premiar o especialista contratado com participações na sociedade (sejam em quotas, sejam em ações).
Portanto, o vesting é um instrumento que deve ser utilizado com cautela e de forma estratégica pela startup, a fim de se evitar a pulverização do capital social.
2. Como o Vesting pode beneficiar a minha startup?
Tendo em vista a perspectiva atual de negociações, em que, para ser bem sucedida, ambas as partes precisam ganhar (win-win), este regime de contratação de talentos trará benefícios para os dois lados na medida em que:
(a) o contratado terá o direito de comprar ações ou quotas da startup por preço bem abaixo do praticado no mercado; e (b), ao possuir tal opção, ficará engajado em trabalhar ainda mais para que a sua futura participação se valorize, pois quanto mais valorizada, maior o seu potencial de liquidez.
Ou seja, o contrato de vesting incentivará o especialista contratado a entregar melhores resultados, pois, uma vez que possui a opção de comprar participação da startup em que trabalha, se esforçará ao máximo para que o valor dessa participação aumente. Ocorre que o valor da participação, isto é, do valor da quota ou da ação, está diretamente ligado ao aumento do patrimônio líquido da empresa, que, por sua vez, está atrelado ao aumento considerável das receitas em detrimento dos custos.
Assim, quanto mais a empresa crescer em termos financeiros, maior o potencial de ganho do contratado no momento de exercer o seu direito de compra das ações ouquotas.
Agora que você já sabe em quê consiste o contrato de vesting, qual o seu objetivo e comoele pode beneficiar a sua startup, está na hora de saber as características mais importantes.
3. Quais as principais características?
Como se percebe, no Contrato de Vesting haverá a cláusula de opção de compra, na qual o executivo poderá, após determinado tempo e/ou ocorrência de determinado evento (normalmente ligado ao atingimento de metas), exercer o seu direito de compraras ações ou quotas da startup, dentro de um determinado tempo, por um preço certo e determinado, mas abaixo do valor de mercado.
A principal característica dessa opção de compra no Contrato de Vesting é que o direito de compra cresce à medida em que o contrato vai sendo cumprido durante o período determinado.
Por exemplo, poderá ser estipulado, em um contrato de vesting de 04 anos, que o contratado adquirirá ao fim o direito de comprar 10% das quotas sociais, mas este direito vai crescendo ao longo de cada ano. Assim, ao fimdo primeiro ano o contratado terá o direito de comprar 2,5% das quotas; no segundo, 5%; no terceiro, 7,5% e no quarto, 10%. No entanto, se exercer o seu direito antes do final do período de vesting, ele perderá o direito de comprar o percentual restante.
Portanto, as principais características desse contrato são:
a) período de vesting, que deve ser definido de acordo com a necessidade da empresa em atrair e/ou reter o talento contratado; b) quantidade total de quotas e ações, que deve ser definida de acordo tanto com a necessidade de atração/retenção quanto com a possibilidade de disponibilização de quotas, sem que isso afete demasiadamente a participação e o controle dos sócios-fundadores ; e, c) forma de crescimento das ações ou quotas .
4. Qual o tempo de duração do Contrato de Vesting?
Já que o objetivo desse contrato é reter o especialista para que ele produza e cresça junto com a startup, é comum que os contratos de vesting estabeleçam um período de 03 a 06 anos de duração.
No entanto, é importante que o contratado não possua a opção de compra de ações ou quotas desde o início, evitando-se justamente a entrada facilitada de um terceiro no quadro de sócios da empresa.
Para isso, será estabelecido no contrato o Cliff, que nada mais é do que um estágio inicial de crescimento, no qual estarão resguardados tanto a empresa sobre o real desempenho do contratado, quanto o contratado sobre as reais políticas de governançada empresa contratante.
Assim, o Cliff pode ser comparado a um período de teste, em que o contratado somente terá o direito de compra após o seu término.
5. Como ocorre a execução do Contrato de Vesting na prática?
A operacionalização do vesting pode ser feita a partir de: a) milestones ou b) por prazo.
A primeira opção cria metas a serem atingidas pelo colaborador que, quando atingidas, resultam no direito de “vestir” a participação societária. Portanto, caso seja utilizada essa forma de operacionalização, devem ser definidas metas claras e objetivas. Assim, além da clareza na negociação, é possível determinar “pacotes” de quotas ou ações de acordo com as metas atingidas, parcelando, portanto, o total de ações a serem adquiridas pelo colaborador.
Por exemplo, é possível estabelecer em um contrato de vesting de 05 anos que o colaborador deverá passar por um período de Cliff de 01 ano. Após esse primeiro ano, ele estará elegível para ter a opção de compra de 2,5% do capital social, mas apenas se ele atingir uma meta X; de 5%, caso ele atinja uma meta 2X; ou de 7,5% caso ele atinja uma meta de 3X. Estas metas podem estar, por exemplo, atreladas às vendas por ele realizadas, ao faturamento alcançado pela empresa ou à outra forma de medição de seu desempenho.
A segunda opção, no entanto, utiliza-se da característica temporal para “vestir” o colaborador na participação societária. Ou seja, ele adquirirá o seu direito de compra conforme o tempo em que permanece na startup. É, portanto, uma forma de retenção do colaborador.
Por exemplo, é possível estabelecer em um contrato de vesting de 05 anos que o colaborador deverá passar por um período de Cliff de 01 ano. Após esse primeiro ano, ele estará terá a opção de compra de 2,5% do capital social durante esse segundo ano de contrato; de 5%, caso ele exerça o seu direito apenas no terceiro ano de contrato; ou de 7,5% caso ele exerça o seu direito de compra durante o quarto ano de contrato.
7. Quais cuidados tomar ao redigir um Contrato de Vesting?
O primeiro cuidado que os sócios-fundadores e/ou administradores da startup devem ter é que esse modelo de contrato, o vesting, não substitui os regimes tradicionais de contratação. Isto é, um indivíduo pode ter, ao mesmo tempo, um contrato regido pela normas da CLT e outro que trate do vesting.
Assim, é preciso ter cuidado com as questões trabalhistas e previdenciárias, pois muitasvezes esse instrumento pode ser utilizado para maquiar uma relação inexistente de trabalho. Isto porque, como os colaboradores de uma startup devem ser contratados sob algum dos regimes legalmente previstos, a remuneração que o contratado recebe em razão de seu trabalho com não se confunde com o valor que ele pode vir a ter direito sobre as quotas ou ações devidas em razão do contrato de vesting.
Em segundo lugar, os empresários deverão levar em conta a (in)existência de acordos parassociais ou de cláusulas do próprio contrato social que, em maior ou menor grau, influencie na execução do contrato de vesting.
Caso existam acordos parassociais (entre os próprios sócios ou entre os sócios e terceiros), é preciso eles "conversem" com o instrumento de vesting para que não hajam divergências entre os termos. É comum, por exemplo, que algum sócio (fundador, investidor-anjo, etc) possua direitos de preferência sobre a participação societária dos demais, fazendo com que tenha interesse direto na quantia a ser negociada no contrato de vesting.
Um terceiro ponto a ser levado em consideração é o tempo do próprio vesting. Apesarde ser comum um contrato com duração entre 03 e 06 anos, esse tempo precisa ser estabelecido pelos sócios de acordo com a atividade a ser desempenhada pelo contratado, o ramo de atividade da empresa, o percentual de participação societária e, claro, com os objetivos almejados pela sociedade com a realização desse contrato.
Por exemplo, é possível que o indivíduo contratado não possua todo o talento esperado pela startup, ou até mesmo que ela tenha problemas em se adaptar à cultura da empresa. Nesse caso, um vesting muito longo (de acordo com os critérios acima) e sem alternativas de término antecipado pode prejudicar a empresa como um todo.
Por último, o quarto ponto que deve ser levado em consideração pelos sócios no momento de elaboração do contrato de vesting é, justamente, a definição de hipóteses de término antecipado do contrato.
Aqui, as situações e suas respectivas consequências podem ser infinitas, mas podemos condensar as hipóteses em quatro classificações: a) renúncia ao cargo; b) rescisão (com ou sem justa causa); c) morte; d) incapacidade.
Assim, por exemplo, é natural que na ocorrência de renúncia do cargo ou de rescisão com justa causa o trabalhador perca todos os seus direitos relacionados ao contrato de vesting. Por outro lado, caso a renúncia ao cargo tenha sido, de alguma forma, forçada pela própria empresa, ou se o contrato foi rescindido sem justa causa, os direitos relacionados ao vesting devem ser acelerados, possibilitando ao contratado que exerça imediatamente o seu direito de compra do percentual de participação societária a ele destinado no contrato.
Já nos casos de morte ou incapacidade, é interessante que a startup preveja a impossibilidade de aceleração dos direitos previstos no vesting, evitando-se que os herdeiros sucessores do contratado demandem contra a sociedade — até porque já existem no mercado opções de seguros que cobrem essa situação, o que evitaria que o contratado ficasse descoberto e, ao mesmo tempo, não oneraria a sociedade.
Artigo escrito por Lucas Barbosa e publicado originalmente em 16 de outubro de 2020 no blog do escritório Targino Bastos - Advocacia e Consultoria.
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